No peito inda verde
secou-se a ventura
daquela fé pura
que a infância nos dá;
no espelho onde via
em êxtase santo
os risos, o encanto,
de um mundo, que há tanto
não sei onde está.
Em dita tão pura
minh'alma exultava,
e quanto alcançava
sabia explicar;
que, além de dar crença
a tudo que ouvia,
por certa magia,
as cousas que via,
sentia falar.
Se às vezes tentava
brincar com as flores,
revendo os lavores
de um vasto jardim,
a brisa me dava,
no trânsito leve,
um cântico breve,
escrito na neve
de um casto jasmim.
Fugaz borboleta
nas asas de ouro
imenso tesouro
deixava-me ver;
e, qual um avaro,
sedento, inquieto,
com ardido afeto
atrás do inseto
me punha a correr.
Qual boca de ninfa
há pouco desperta,
se rosa entreaberta
prendia louçã,
segredos da infância
a flor me contava,
q'eu só escutava,
e, rindo, exclamava:-
tu és minha irmã!... (Miguel de Cervantes)
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